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Decisões tomadas nas próximas décadas serão fundamentais para definir a cor predominante do Nordeste brasileiro: o marrom da seca ou o verde das lavouras. Relatório produzido pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), prestes a ser lançado e ao qual o Estado de Minas teve acesso, aponta que a região deve sofrer com condições climáticas mais adversas que aumentarão o risco de desertificação de várias áreas. No entanto, o documento também lista uma série de tecnologias que vêm demonstrando resultados positivos e, caso sejam implementadas de maneira mais consistente, podem garantir a qualidade da terra.
A
desertificação é o processo de empobrecimento do solo até o ponto em que
ele não pode mais garantir a subsistência da população de determinado
local. De acordo com a Convenção das Nações Unidas de Combate à
Desertificação (UNCCD, na sigla em inglês), que elegeu o dia de ontem
como a data mundial de combate ao problema, 42% da população global
vivem nas chamadas terras secas, mais suscetíveis ao fenômeno. Trata-se
de áreas submetidas à influência de climas áridos, semiáridos e
subúmidos secos. No Brasil, compõem quase 15% do território.
Segundo
Antônio Magalhães, assessor técnico do CGEE, organização social
supervisionada pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI),
o principal feito do estudo é delimitar com precisão inédita qual é a
região brasileira suscetível à desertificação, o que serve de importante
guia para as políticas públicas de prevenção. As terras secas
brasileiras incluem parte de todos os estados nordestinos, mais o Norte
de Minas Gerais e um pedaço do Espírito Santo. São 1.491 municípios e
mais de 1,3 milhão de quilômetros quadrados. A Bahia é o estado com o
maior número de municípios na área (291), seguida de Piauí (217) e
Paraíba (209).
Foi possível, ainda, apontar as áreas que exigem
mais atenção. Dados dos índices de chuva entre 1950 e 2012 mostram que
são altamente vulneráveis à desertificação o Centro-Leste do Piauí, a
quase totalidade do Ceará, o Norte da Bahia e o Centro-Oeste de Rio
Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco. “Com as mudanças climáticas,
essas áreas podem se tornar ainda mais suscetíveis”, alerta Magalhães,
destacando um dos pontos do relatório.
O
especialista ressalta, contudo, que o clima não deve ser
responsabilizado pelo empobrecimento extremo do solo, que já se observa
em alguns municípios nordestinos. “Enquanto a seca é um fenômeno
climático, a desertificação é um fenômeno humano”, afirma Magalhães, que
já presidiu o Comitê Científico da UNCCD. E o documento de quase 300
páginas mostra bem isso. Além de usar imagens fornecidas pelo satélite
norte-americano Landsat 8, os 36 especialistas envolvidos no trabalho
traçam um perfil sócio-econômico da região que ajuda a entender como
certas práticas favorecem o problema.
Os pontos em que a
caatinga, bioma característico do semiárido, já cedeu são aqueles em que
o desmatamento avança para abrir espaço para a agricultura, produção de
energia ou comércio de madeira. Com a falta de medidas para conter o
processo de erosão dessa terra desnudada, o solo fica cada vez mais
pobre, até entrar em colapso. A paisagem muda, com a substituição da
vegetação de caatinga por uma típica de climas áridos, com predominância
de cactáceas.
Combater o fenômeno, lembra Magalhães, depende
fortemente da intermediação do Estado, pois envolve escolhas complexas.
Ele dá um exemplo. Muitas das áreas onde o problema tem piorado
apresentam uma grande produção de cerâmicas, atividade que retira seus
recursos da natureza — o barro (retirado dos rios) e a madeira que
alimenta os fornos (das árvores). A prática tem levado à desertificação,
mas, se for simplesmente interrompida, deixará muitas famílias sem
emprego nem renda. “É um dilema de longo prazo a ser enfrentado pelas
políticas públicas”, resume.
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