• Matéria: Português
  • Autor: paulina77
  • Perguntado 8 anos atrás

como era a vida de Frankenstein 1994?

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respondido por: KayLopes
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A história de Frankenstein, da autoria da escritora romântica inglesa, Mary Shelley, é uma das mais conhecidas da cultura ocidental, tendo inspirado inúmeras obras e originado outras tantas reinterpretações, quer na literatura, quer no cinema. Neste meio, Frankenstein tornou-se sobretudo sinónimo de terror, popularizado (e definido mesmo), pelo consagrado filme de James Whale (Frankenstein, 1931), com Boris Karloff no papel do monstro, o qual inspiraria uma série de sequelas produzidas pela Universal.

Escrito no início do século XIX, como uma história gótica de terror, o livro terá sido o resultado de um desafio entre Mary Shelley, o seu marido Percy Bysshe Shelley, Lord Byron, e o médico deste, John William Polidori, quando todos passavam férias na Villa Diodati, na Suíça, propriedade de Byron. Contendo todos os elementos que ajudariam a definir o gótico (desde a a subjectividade do “eu”, os estados de espírito perturbados, o tortuoso e arrogante herói byroniano, a ruína e decadência da paisagem como marcas da alma humana, a inquietação do mistério e do terror), o livro de Mary Shelley ultrapassa o género, contendo também elementos que vão da filosofia à ficção científica. De facto, Shelley propõe-nos uma obra que lida com algo tão metafísico como a essência da vida humana, que ela vê como tendo paralelos na electricidade (então uma moda científica). Através das experiências proibidas de Frankenstein, este retira aos deuses algo que antes lhes pertencera por exclusivo: criar vida (daí o subtítulo de Prometeu Moderno), isso traz um mar de perguntas sobre o que é a vida humana, a consciência, a alma, o ser.

Apesar de toda esta profundidade (que alguns autores vêem como um exorcismo da própria Mary Shelley, a qual perdeu mais que um filho prematuramente), o monstro de Frankenstein passou ao cinema, principalmente como um disforme e sádico personagem de terror, muito por culpa da série da Universal, mais tarde reinterpretada pela Hammer, num gótico mais barroco e decadente.

Com muitas variações sobre o tema, a maioria com muito pouco em comum com o livro da autora, destacou-se em 1994 “Frankenstein de Mary Shelley”, numa realização de Kenneth Branagh, um actor e realizador que se notabilizara pelas suas várias produções cinematográficas a partir de peças de Shakespeare. Partindo do sucesso recente de “Drácula de Bram Stoker” (Bram Stoker’s Dracula, 1992) de Francis Ford Coppola, a American Zoetrope (de Coppola) que produzira a recente versão de Drácula, achou por bem captalizar o crédito adquirido, ao prosseguir aquele filme com outro clássico do gótico de terror.

A história, bem conhecida, trata da vida de Victor Frankenstein (Kenneth Branagh), o homem que queria vencer a morte, e para isso fez um corpo humano a partir de cadáveres, no qual insuflou vida, através do uso da electricidade. Só que ao ver o monstro por si criado (interpretado por Robert De Niro), Victor Frankenstein sucumbiu vítima da sua culpa e de uma enorme repulsa, rejeitando a sua criação. Julgando-o morto, Victor Frankenstein não sabe que o monstro se refugia na floresta e vai aprendendo a viver, observando os camponeses. Mas ao perceber que as suas deformidades o tornam um motivo de repulsa, o monstro decide vingar-se de Frankenstein, acabando por lhe matar o irmão mais novo e retirar aquela que o médico ama, a irmã adoptiva e noiva, Elizabeth (Helena Bonham Carter).

Só que Kenneth Branagh não é Coppola, e onde o segundo pautou o seu filme por uma extrema elegância e discrição, o primeiro não resistiu a toques de grandeza e exuberância que marcam o seu filme negativamente. E onde Coppola injectou nova vida no conto de Drácula, com alusões a uma história de amor imortal, Branagh usou uma forçada história de amor de um modo desconjuntado, que faz alguns momentos do filme roçar o patético.

Embora seja talvez o filme que mais se aproxima do livro de Shelley, e uma produção ricamente cuidada, “Frankenstein de Mary Shelley” (filmado na Inglaterra e nos Alpes suíços) sofre sobretudo do peso das idiosincrasias de Branagh, que nunca deixa de ser ele próprio ao compor um Victor Frankenstein excessivamente emotivo e frenético. O filme fica marcado por uma acção nervosa de movimentos de uma grandiosidade exagerada, onde cada plano parece provir de um épico maior que a vida. Destaca-se pela positiva a criação do monstro, numa interpretação sólida de Robert De Niro (com uma caracterização impressionante), que confere à sua personagem uma profundidade rara nos filmes sobre este tema.

Com toda a temática filosófica de Shelley, alusiva à ética científica e à essência do ser, ofuscadas por uma excessiva exuberância visual, o filme foi uma desilusão em relação a “Drácula de Bram Stoker”, e um semi-fracasso a nível comercial. Em resultado Branagh não voltaria a super-produções como esta, preferindo voltar a filmar dramas mais modestos e novas adaptações de peças clássicas de teatro.
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