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No hospital, fiquei amarrado numa maca, nu, sem poder me mover. Dois dias num corredor, com frio, e ninguém me dava um cobertor. Acho que fiquei delirando, acordava e dormia, e só lembrava de filmes, principalmente Frances, com Jessica Lange. O que achei até meio chique. Dois dias depois acordei numa cama. Minha irmã, Cláudia, entrou no quarto, nos abraçamos e choramos. Fiquei dois meses no hospital. Comecei a tomar AZT.
Também me diverti muito. Fiz amizade com muitas enfermeiras – habituadas a lidar com as verdades da vida, são pessoas diretas e sinceras – com todo mundo. O cara que fazia a faxina era pai-de-santo, uma outra enfermeira fazia parte de um grupo que tinha contatos com uma civilização extraterrestre, uma médica era kardecista, uma psicóloga me disse que tinha feito uma masectomia e estava toda ligada em anjos. O médico que me tratava era meu leitor. Ele teve um cuidado especial comigo e fiquei confiando nele. Eu pensava: “Bom, se o Francisco gosta do que escrevo, não vai querer me matar”. Quando saí do hospital , tudo me parecia tão precioso.
Como não escondi, desde o primeiro momento, que estava com Aids, não tive vergonha. Quando a gente não esconde, não há rejeição. Posso contar nos dedos de uma mão as pessoas que pararam de ligar. Nenhum amigo íntimo desapareceu. E tem uns, como a escritora Lygia Fagundes Telles, que ligam toda semana. Talvez eu tenha sorte, meus amigos sejam muito bons. Ou talvez, no meio em que eu circulo, isso já virou meio arroz-de-festa, ninguém mais nota a questão da Aids
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