Respostas
Toda profissão ou, como talvez crítico de arte não seja profissão, toda atividade humana tem seu momento de angústia do goleiro na hora do pênalti. É verdade que, a rigor, só quem nunca jogou futebol pode imaginar que a angústia na hora do pênalti seja do goleiro. Na hora do pênalti o goleiro está no auge da excitação, o contrário da angústia: está literalmente a um passo da glória e ansioso por vê-la chegar. Quem fica com a angústia é o batedor, que gostaria que aquele momento fosse adiado para toda a eternidade. Minha angústia é a do batedor de pênalti e ela se traduz na angústia diante da possibilidade de que me cobrem meus critérios no instante de fazer aquilo que se chama a crítica de arte. Minha angústia é que me perguntem “Mas, qual, afinal seus critérios para dizer o que diz?” e eu não saiba responder. Minha sorte e a sorte deste tipo de batedores de pênalti é que essas perguntas hoje se fazem cada vez menos... A ausência dessa prática deveria fazer pensar. Se não se pensa o suficiente sobre isso é porque o recalque praticado contra essas perguntas -- que no fundo, abaixo da superfície, continuam a existir-- faz parte do atual sistema da arte. Por que hoje, e em linhas gerais desde os anos 70, não é mais o caso de se fazer essas perguntas, nem ao crítico, nem ao artista? Alguns artistas, é verdade, esperam que os críticos respondam por eles às eventuais perguntas que lhes possam ser feitas. Mas, como digo, dificilmente se pergunta ao crítico por quê e em nome do quê ele diz o que diz. Mesmo assim, com freqüência minha angústia aflora: e se me perguntarem por meus critérios? Mesmo quando ninguém me faz essas perguntas, mesmo quando é apenas a obra de arte que, no silêncio total de uma relação direta entre mim e ela embora no meio de uma multidão de pessoas excitadas nas salas de uma bienal, me faz essas perguntas, que direi eu a essa obra e a mim mesmo? Uma velha angústia que continuamente retorna e para a qual periodicamente devo encontrar respostas.