• Matéria: História
  • Autor: Marj123
  • Perguntado 7 anos atrás

Resenha do filme Netto Perde Sua Alma

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respondido por: khateellyane
7

Resenha: Netto Perde Sua Alma, de Tabajara Ruas

13 de outubro de 2013

“Pontual como sempre, a enfermeira-chefe Rosita Zubiaurre atravessa o corredor com seu passo enérgico em direção aos quartos dos oficiais, estranhando a porta fechada do gabinete do cirurgião, tenente-coronel Philippe Fointainebleux. A porta do cirurgião fechada a esta da manhã é realmente um fato notável no seu metódico cotidiano.”

Embora essa introdução não diga muita coisa a princípio sobre o tema do romance, ela deixa clara uma coisa: tem algo incomum acontecendo. Esse “algo incomum” é o que acaba dando início a essas memória do general Antônio de Souza Netto, militar gaúcho que se envolveu em vários conflitos, seja contra a monarquia ou contra inimigos estrangeiros – exemplos: a Guerra dos Farrapos e a do Paraguai.

A proposta de Ruas é contar a história do Rio Grande do Sul através de uma protagonista forte, marcante – tal qual Rodrigo Cambará em “O Tempo e o Vento”. Ocorre que contar a história de Netto é um feito complexo, pois, como ele mesmo declara na orelha do livro, “as notas biográficas a seu respeito são poucas e incompletas”. Uma coisa é termos um Cambará que reúna as qualidades do homem gaúcho, mas outra é reproduzir um exemplar desse homem gaúcho – em ambos os casos há uma crise de mímese, mas que se acentua mais no segundo caso que no primeiro por conta da referência real. No entanto, justamente pela falta de dados é que o romance obtém êxito, visto que as lacunas reais podem ser preenchidas com o que se espera que o exemplar real tenha feito ou dito em vida.

Netto encontra-se internado em um hospital militar em Corrientes, Argentina, após ser ferido em combate. É o segundo ano da Guerra do Paraguai, Netto lutando pelo país contra o qual guerreou um dia – ex-farroupilha e republicano, o general relembra esses episódios em momentos de delírio por conta da febre ou ao conversar com os demais pacientes, alguns deles seus comandados.

O núcleo do romance é um momento triste e doloroso para um de seus soldados: o capitão de los Santos tem suas duas pernas amputadas pelo cirurgião, o referido Fontainebleaux. O tenente-coronel francês se voluntariou para participar da guerra. O capitão acusa o cirurgião de tê-lo feito de propósito, de não ser asséptico, de estar torturando os demais pacientes do hospital. É impossível ao leitor saber se isso é verdade ou não, pois o foco narrativo está todo em Netto, mas algo inquieta a protagonista:

“Netto não consegue mais dormir. Pensa no tenente-coronel Philippe Fontainebleaux. É sua obrigação denunciar o tenente-coronel. Foi uma maldade cortar as duas pernas do capitão de los Santos. Precisa falar com o comandante do hospital. Esse francês é um homem perverso. Percebeu desde o instante em que ele entrou no quarto pela primeira vez, com aquele sorriso.[…]

As mãos dele não cheiravam a éter ou iodo ou a qualquer produto semelhante com que costumam cheira as mãos dos médicos. Cheiravam a sexo e a urina. Era um desrespeito.”

Mas se isso já não é um argumento muito forte para o leitor, visto que o ponto de vista que temos é apenas o do general, tampouco o oficial pode ter alguma certeza disso:

“Talvez fosse o caso de denunciar o tenente-coronel, mas talvez não fosse. Estão em guerra. Cirurgiões fazem falta. Esse francês é voluntário. Ninguém sabe do seu passado, mas é voluntário, e cirurgiões fazem falta.”

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