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Em passagem pelo Estado para a conferência de abertura do 14º Congresso Internacional do Orçamento Participativo, em Canoas, nesta semana, o filósofo italiano Antonio Negri, autor de obras como Império (2000) e Multidão (2004), em parceria com Michael Hardt conversou com o caderno PrOA sobre o primeiro ano das manifestações de junho.
Antonio Negri - A multidão se organiza em torno dos eventos do momento, nos quais uma linguagem comum se expressa. Uma linguagem comum que nasce da indignação e do protesto, do cansaço de sempre se encontrar em situações que não têm saída. É exatamente como antes era com a classe operária. A multidão se organiza à base de paixões que caminham junto com a resistência e com tentativas de construções de uma perspectiva de uma nova via de solução dos problemas. Não há muita diferença do ponto de vista entre a multidão e todos os outros movimentos que nascem da base de necessidades ou anseios fundamentais de se viver e produzir. Mas há um outro elemento que é a singularidade. Quando a multidão se move, nunca é simplesmente uma massa, é uma riqueza plural de elementos de questionamentos de vida. É claro que aqui nasce um problema de organização. Há um grande problema de unidade, de articulação dos movimentos, em meio a muitas singularidades. Mas esta é também a riqueza, a beleza do processo que vivemos.
Como as manifestações de junho de 2013 no Brasil se inserem no contexto internacional? Em que medida são parte do mesmo ciclo de reações como a Primavera Árabe e o Occupy Wall Street e em o que expressam de singularidade?
Negri - É difícil precisar. Os movimentos surgem a partir de um clamor por democracia substancial. É claro que no Brasil teve um estranho curto-circuito entre um discurso político que foi pregado por Lula, pelo PT, aos jovens, e depois esse discurso se encontrou diante de obstáculos, como o custo da passagem do ônibus. Isso foi interpretado como uma espécie de provocação, como esses enormes gastos com os megaeventos, esses gastos que parecem não dizer respeito à vida das pessoas. É preciso considerar também que a multidão está inserida em um processo vital e metropolitano. Pode se dizer que a classe operária estava para a fábrica como a multidão hoje está para a metrópole. A multidão tem essa sensibilidade particular aos serviços metropolitanos, o bem-estar nas metrópoles contemporâneas e, portanto, vai em busca dessas coisas. Assim nasce a luta, a resistência, mas, também, uma proposta de felicidade.