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ERA JUNHO, auge da enchente, por isso tivemos que embarcar na beira do igarapé do Poço Fundo e navegar até a casa no meio da ilhota.
Os moradores das palafitas olhavam-nos com surpresa, como se fôssemos turistas perdidos num lugar de Manaus que podia ser tudo, menos uma atração turística. No entanto, o cientista Lavedan, antes de voltar para Genebra, insistiu para que o acompanhasse até a casa ilhada, teimando em navegar num rio margeado de casebres miseráveis.
Nós nos encontramos no fim de uma manhã ensolarada lá no Bosque da Ciência, um dos raros recantos em que Manaus se concilia com a natureza. No Bosque os animais e peixes e plantas são conhecidos, e há sempre um cientista pronto para dissertar sobre pássaros, mariposas, orquídeas ou a arquitetura móvel dos cupins. Algumas árvores estão ali há cinco séculos, o aquário atrai como uma música das esferas, e os peixes, aprisionados, se tocam e se roçam e serpenteiam na água cristalina, tão diferente de sua morada original: o fundo de um lago ou rio de onde foram fisgados para sempre.
Eu estava diante do aquário, admirando um peixe pequeno e estranho à flor da água, quando uma voz estrangeira murmurou atrás de mim:
"É o tralhoto, um teleósteo da família..."
O homem parou de falar, tocou no vidro do aquário e acrescentou em voz alta: "Não importa a família, o que importa é o olhar desse peixe".
Então eu soube que o tralhoto, com seus olhos divididos, vê ao mesmo tempo o nosso mundo e o outro: o aquático, o submerso.