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Um casal de namorados troca juras de amor. O locutor de um jogo de futebol transmite um lance pela ponta esquerda. Um cientista faz uma comunicação sobre buracos negros num congresso de Astrofísica. Por incrível que pareça, essas três situações podem estar relacionadas às remotas andanças de um pequeno mamífero comedor de insetos, semelhante ao atual musaranho, que vivia há uns 65 milhões de anos, mais ou menos à época em que os dinossauros sumiram da face da Terra. Pois aquelas situações têm algo em comum: o uso da linguagem. E as hipóteses mais recentes sobre as origens da linguagem – apresentadas há poucos meses num seminário internacional que reuniu 150 especialistas em Cortona, na Toscana, Itália – envolvem justamente as antiquíssimas aventuras daquele mamífero comedor de insetos.
Do que se discutiu em Cortona, emergiu a convicção de que a linguagem – um mecanismo de comunicação que a rigor só os humanos possuem – não teve um início único, bem demarcado no tempo. Mas foi produto de uma série de processos, separados uns dos outros às vezes por muitos milhões de anos e que vieram a se combinar no ser humano. Os organizadores do simpósio de Cortona, os antropólogos italianos Brunetto Chiarelli e Andréa Campero Ciani, fizeram uma síntese das discussões ali travadas, que vale como uma síntese das hipóteses mais aceitas até agora sobre as origens da linguagem. É claro que muitas incertezas e controvérsias permanecem – como, de resto, em praticamente tudo o que diz respeito à vida dos antepassados do homem. Mesmo quando os especialistas (paleontólogos, antropólogos, biólogos, entre outros) concordam em relação a um evento, por exemplo, podem divergir quanto ao período aproximado em que ele se deu. O capítulo da linguagem não é exceção.
A história contada por Chiarelli e Ciani começa quando os musaranhos, acostumados aos campos, passaram a subir às árvores das florestas. Nesse nicho ecológico, com o decorrer das gerações, eles passaram a desenvolver características mais adequadas ao novo ambiente. Primeiro, começaram a desenvolver a visão binocular, em que as imagens vistas pelos dois olhos se confundem numa imagem única, tridimensional. A par disso, surge a visão em cores. Isso multiplica as chances de sobrevivência no ambiente multiforme da floresta, onde perceber detalhes (um animal predador escondido na folhagem) pode fazer a diferença entre a vida e a morte.