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Resposta:
Apesar de estar consciente desses problemas, gostaria de tentar assentar alguns princípios básicos, que pudessem contribuir para a construção de uma teoria de valores no campo da arte; porque acredito que o futuro de nossa arte dependerá, decisivamente, do estabelecimento de uma consciência de valores.
O conceito valor não pode ser definido rigorosamente. Ele pertence àqueles conceitos abrangentes como ser, existência, realidade, entre outros, que não comportam uma definição propriamente dita. Por conseguinte, podemos apenas tentar aclarar o sentido da palavra valor.
Não me proponho, no curso deste ensaio, a dar uma resposta definitiva aos problemas persistentes e variáveis dos critérios de valor na arte, mas esforçar-me-ei, pura e simplesmente, no sentido de uma contribuição para a resposta e discussão de questões básicas e importantes da criação artística de nosso tempo; especialmente nos países do Terceiro Mundo, isto é, nos países que não possuem uma tradição artística como é entendida no mundo ocidental. Países nos quais vivi a maior parte da minha carreira.
Quando falo de países do Terceiro Mundo, refiro-me a um complexo populacional, que social, cultural e economicamente não é homogêneo. Um complexo populacional no qual existem diferenças interculturais de importância fundamental, que ainda hoje pertencem a diferentes fases de desenvolvimento cultural e, em conseqüência disso, devem ser diferenciadas.
A primeira fase, em que o homem era apenas apto para a coleta e a caça; uma segunda fase, caracterizada pela domesticação de plantas e animais, em outras palavras, agricultura e pecuária, e por manufatura rudimentar; assim como uma terceira fase, que teve seu começo há quase dois séculos e meio, ou seja, desde a chamada Revolução Industrial, na qual o homem se tornou apto, mediante a exploração de fontes de energia sempre novas e mais poderosas, pelo esforço sistemático para a melhoria de seus conhecimentos na área das ciências naturais, a aperfeiçoar suas capacidades medicinais e tecnológicas, e sua capacidade produtiva em uma medida jamais esperada anteriormente: aumentando sua expectativa de vida, multiplicando a população, mas, ao mesmo tempo, aperfeiçoando seus meios de aniquilamento, no sentido de fazer com que seus conflitos sociais e, especialmente, internacionais se tornassem sempre mais perigosos para toda a humanidade.
Essa terceira fase criou, de fato, em todas as áreas, uma nova situação de vida, para cujo entendimento as experiências do passado são insuficientes.
Ao mesmo tempo, deve-se tomar em consideração o fato de que nos países do Terceiro Mundo se desenvolveu um processo de integração sócio-cultural, que gerou como conseqüência instituições sociais, cuja complexidade, abrangência e estruturação são diferentes daquelas, que pouco antes da independência desses países, na época da colonização, determinavam a experiência da maioria das pessoas.
Com relação à América Latina, deve-se ainda ter em vista que se trata de países de imigração, países em desenvolvimento, nos quais insuficientes conhecimentos e oportunidades de experiência, ignorância e indiferença, ou os dois juntos, são freqüentes; que na maioria dos países, os programas das escolas são imitados, com poucas diferenças, dos países economicamente mais influentes da Europa Ocidental ou dos Estados Unidos, sem que se leve em consideração a própria realidade.
Na análise e no entendimento dos países do Terceiro Mundo, não se deve esquecer o efeito que têm as flutuações em condições sociais e culturais básicas; refiro-me às mudanças e conflitos, que — como até há poucos séculos em nossa própria cultura ocidental — colocam em questão os valores tradicionais; como, por exemplo, constância, perseverança, estabilidade; a orientação para o transcendental, ou seja, as formas de vida tradicionais, religiosas, entre outras. Em vista do que acabei de mencionar, não é difícil entender que determinadas obras artísticas, ou a criação artística como um todo, as quais para o europeu — carregado de uma tradição artística de praticamente dois mil anos — possam ter valor, não tenham necessariamente de ser valorizadas da mesma forma num país do Terceiro Mundo.
Valor não é qualidade absoluta. Valor é a qualidade relativa de um objeto a ser valorizado, que exprime uma relação — e, mais precisamente, uma relação dinâmica — entre este e o homem, conseqüentemente entre este e a sociedade. Características na música, por exemplo, de altura, duração, timbre, intensidade e outras, não são necessariamente objetivas em uma obra de arte. Não se deve esquecer que, em verdade, não há objetividade. Que objetividade é sempre um mínimo de subjetividade. Porque o homem não pode desempenhar o papel de um observador objetivo, mas, ao contrário, está a cada momento sendo compreendido no mundo observado, influenciando as propriedades do objeto observado.