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A data de 21 de março é conhecida por ser o Dia Internacional da Luta Contra a Discriminação Racial e é um marco na batalha pelas conquistas de direitos sociais para a população negra. A efeméride foi criada pela ONU (Organização das Nações Unidas) em memória às 69 vítimas fatais do “Massacre de Sharpeville”, ocorrido em 1966, na África do Sul. Em meio ao apartheid, 20 mil pessoas negras protestavam pacificamente contra a instituição da Lei do Passe, que previa a obrigatoriedade de negros portarem cartões de identificação nos quais constavam os locais aonde eles poderiam ir, quando tropas do exército local começaram a atirar contra os manifestantes – 186 pessoas ficaram feridas após o massacre.
Além do respeito à memória das vítimas do massacre, a data é um marco na luta da comunidade negra contra o racismo estrutural e a discriminação. No Brasil, em especial, a data marca os 40 anos de atuação do movimento negro, que obteve conquistas significativas: a luta pela inclusão de pautas fundamentais na Assembleia Nacional Constituinte, em 1988, com destaque para a criminalização do racismo; a rememorização do tricentenário de morte de Zumbi dos Palmares, em 1995; a adoção de políticas públicas para ao ingresso de jovens negros na universidade, com destaque para a criação de cotas raciais; entre outras vitórias do movimento.
“Se há singularidade este ano, essa é a necessidade de ação política consistente e de resistência ao desmonte de políticas públicas de modo geral, o que implica o aumento da violência contra a população negra, em especial o extermínio, e de enfrentamento às políticas de caráter neoliberal, que afetam a população negra e as suas conquistas democráticas dos últimos anos. Esse ano internacional tem papel importante para lembrarmos dos 40 anos de luta política, de conquistas e, agora, de resistência ao desmonte das propostas políticas obtidas nos últimos anos”, explica Juarez Xavier, professor de jornalismo da Unesp e coordenador do NUPE (Núcleo Negro para Pesquisa e Extensão) da mesma instituição.
Estágios do racismo
Pode-se dizer que há três níveis de discriminação racial no Brasil. O primeiro abrange o preconceito propriamente dito, que fomenta a percepção de que o negro é inferior em relação a pessoas brancas. Na sequência vem a discriminação racial, que consiste em política discriminatória em relação à população negra em âmbitos físico, geográfico, político e conceitual – a segregação racial, em resumo. Por fim vem o racismo, que tem os tripés do genocídio negro, do etnocídio – extermínio de um povo provocado por outro – e o epistemicídio, ou seja, a invisibilização do conhecimento e da cultura negra em detrimento a outra, que é hegemônica.
Apesar de haver avanços, como a instituição da Lei 10.639/03, que propõe novas diretrizes curriculares para o estudo de história e cultura afro-brasileira e africana, assim como a criação de cotas raciais, ainda há muito a ser feito para haver igualdade racial no Brasil. A começar pela revisão de políticas públicas e da atuação do Estado. “O racismo é o aspecto global, que implica no maior índice de mortalidade da população negra. É sistêmico e é diferente do preconceito e da discriminação, que podem ser combatidos com políticas públicas. O racismo implica a mudança da qualidade do Estado, que resulta em violência física e mental contra a população negra, para haver a rearticulação de outro Estado antirracista”, pontua Xavier, sobre o papel do Estado na manutenção do racismo e na necessidade de esse aspecto ser revisado.
O racismo institucional foi conceituado a partir da experiência dos Panteras Negras nos EUA, nos anos 1960, quando os integrantes do movimento pela igualdade racial no país perceberam a estrutura estatal segregacionista em relação à parcela negra da sociedade em pontos como educação, saúde, habitação, acesso ao mercado de trabalho, e assim por diante.
“[O racismo institucional] rompe com a ideia do preconceito e da discriminação, pois não são manifestações isoladas, enquanto ele é global: é o racismo do Estado. Sempre acho importante considerar que ele mobiliza a dimensão do preconceito e da discriminação, mas aprofunda os aspectos da violência física contra a população negra e constitui mecanismos – comunicação, universidade, igrejas de caráter neopentecostais, por exemplo –, para justificar o massacre da população negra. O racismo institucional é todo orgânico, que tem tanto manifestações de coerção física, como de persuasão, ao convencer que a supremacia branca é a melhor forma de organização da estrutura social”, destaca o professor de jornalismo da Unesp.