Em tempos de pandemia, muitas são as contradições ditas nos veículos de comunicação para que a sociedade saiba o que deve ou não ser feito, o que é certo e errado. A partir disso, podem as autoridades, no âmbito de suas atribuições e durante uma pandemia, limitar o direito de ir e vir dos cidadãos? As respostas estão na Constituição Federal de 1988 e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. A princípio, o direito de locomoção é garantido no art. 5º, XV, que prevê: “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”. O direito, contudo, não é absoluto. A própria Constituição da República prevê situações em que ele pode ser limitado, como: (I) prisão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de Juiz; (II) prisão civil, administrativa ou especial para fins de deportação, nos casos cabíveis na legislação específica; (III) durante vigência de estado de sítio, para determinar a permanência da população em determinada localidade, única situação na qual há permissão expressa de restrição generalizada deste direito. Em função da pandemia, foram editadas algumas normas infraconstitucionais prevendo severas restrições ao direito de locomoção. Fiquemos com duas delas: o isolamento e a quarentena. A lei 13.979/20, regulamentada pelo decreto 10.282/20 e portaria 356/20 do Ministério da Saúde, previu que o isolamento consiste na “separação de pessoas sintomáticas ou assintomáticas, em investigação clínica e laboratorial, de maneira a evitar a propagação da infecção e transmissão local”. Ela poderá ser determinada pelo médico ou recomendada por agente sanitário pelo prazo máximo de 14 dias, podendo se estender por mais 14 dias, a depender de resultado de exame laboratorial que comprove o risco de transmissão da doença. A quarentena, por sua vez, é a medida consistente na “restrição de atividades ou separação de pessoas suspeitas de contaminação das pessoas que não estejam doentes, ou de bagagens, contêineres, animais, meios de transporte ou mercadorias suspeitos de contaminação, de maneira a evitar a possível contaminação ou a propagação do coronavírus”. A quarentena poderá ser decretada pelos gestores locais de saúde, como vem sendo feito em diversos estados em que houve suspensão de atividades comerciais e separação de pessoas suspeitas, como São Paulo (decreto 64.881), Goiás (decreto 9.638), Maranhão (decreto 35.677) e Distrito Federal (decreto 40.539). O descumprimento destas medidas pode levar à prisão do infrator pelo crime do art. 268 do Código Penal, que pune criminalmente a conduta de “infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”, pelo que se nota a gravidade na restrição do direito de ir e vir. Ainda que não decretado estado de sítio, única situação que, conforme vimos, há autorização expressa para restrição generalizada da liberdade de locomoção, o direito de ir e vir deve conviver com outros princípios da Constituição da República e não pode ser considerado absoluto. É o caso do direito à saúde. Com efeito, o art. 196 prevê que o direito à saúde tem duas dimensões: (I) como direito subjetivo de todos (“direito a uma prestação no sentido estrito”, segundo expressão de Robert Alexy) e; (II) como dever do Estado de desenvolver uma política pública, abrangendo regramentos, organização pessoal e previsão orçamentária específica. Nesse contexto, a lei 13.949, ao prever as medidas de isolamento e quarentena, traz medidas para salvaguarda do direito à saúde de cada indivíduo (saúde como direito individual) e medidas preventivas operacionais para que Poder Público exercer sua obrigação de tutela da saúde pública (saúde como dever do Estado). São ambas expressões do art. 196 da Constituição da República. Em uma situação como esta, que envolve o conflito aparente entre os princípios da liberdade de locomoção e direito à saúde, o Supremo Tribunal Federal tem aplicado a regra da proporcionalidade para solução do impasse. Paradigmático, nesse sentido, foi o julgamento do “Caso Ellwanger”, em que o Ministro Gilmar Mendes explica no seu voto que: “[...] o princípio da proporcionalidade alcança as denominadas colisões de bens, valores ou princípios constitucionais. Nesse contexto, as exigências do princípio da proporcionalidade representam um método geral para a solução de conflitos” (HC 82.424, j. 17.09.03). A regra de proporcionalidade prescreve que um princípio deve ceder diante de outro desde que atenda aos seguintes requisitos: (I) adequação; (II) necessidade; (III) proporcionalidade em sentido estrito. Portanto, no primeiro momento, devemos nos questionar se as medidas de isolamento e quarentena são adequadas para fomentar o objetivo sanitário perseguido, isto é, a contenção da pandemia de coronavírus, a despeito de restringirem a liberdade de locomoção.
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O texto do enunciado trata sobre os aspectos jurídicos que estiveram presentes na pandemia do covid 19.
Importante notar questões como o direito de ir e vir, tendo em vista que as pessoas tiveram esse direito restringido por conta do isolamento social que obrigou as pessoas a ficarem dentro de casa para não haver a disseminação do vírus em diversos locais.
Veja que os principais direitos sociais das pessoas estão presentes no artigo 5 da constituição federal, inclusive o direito de ir e vir.
Ademais, o uso obrigatório de máscaras também confrontam com a questão da liberdade das pessoas e também envolve preceitos de ordem moral, a possibilitar a saúde pública.
espero ter ajudado!
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