• Matéria: Português
  • Autor: gih565
  • Perguntado 6 anos atrás

de acordo com o conto cem anos de perdão da Clarice Lispector

por que a narradora faz uma descrição detalhada de suas emoções para o leitor?​

Respostas

respondido por: cbmgias
7

Resposta:

Neste breve conto, também passado nas ruas de Recife, Clarice Lispector aborda

novamente o tema da rosa, que lhe é tão caro.

Em Cem anos de perdão ela fala de outra fantasia, tornada talvez realidade, e

cuja satisfação da conquista se assemelha a uma visita aos bairros ricos da cidade,

diferentes do seu, onde em vez de sobrados simples como aquele em que mora há

imponentes palacetes cercados de pomares e jardins, que despertam a sua admiração

e cobiça.

O relato memorialístico lembra a menina Clarice, com uma amiguinha, olhando com a

cara imprensada nas grades, estrangeiras e ávidas, o mundo de beleza e fartura

que lhes é vedado, do qual se sentem exiladas e no qual são, efetivamente, proibidas

de entrar. Elas olhavam para os palacetes e disputavam a posse imaginária deles.

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O enredo se desenvolve em torno dos cálculos da menina para roubar uma rosa de um jardim.

O objeto do roubo é tão pequeno para a importância que lhe dá a autora, que chega a

produzir uma suspeita no leitor.

Ao contrário dos demais contos, nos quais ela implora a outros a satisfação de seus

desejos, ou cede à frustração dos mesmos, neste conto ela não espera nem se conforma,

ao contrário, tece os seus ardis e vai em busca daquilo que deseja, sem se importar

com as conseqüências. É como se toda aquela exuberância e alegria alheias pudessem ser

experimentadas por vias sorrateiras, ilegais, mas tão legítimas quanto quaisquer outras.

A menina apanha a rosa, tomando cuidado para não ser vista.

Enquanto ela colhia as rosas a fim de levar para casa, a colega vigiava.

As duas, usando dessa estratégia, uma colhia, a outra vigiava, passaram a furtar rosas

com freqüência. Além de rosas, furtavam também pitangas. Ladrão de rosas e pitangas

têm cem anos de perdão. As pitangas, por exemplo, são elas mesmas que pedem pra ser

colhidas, em vez de amadurecer e morrer no galho, virgens.

O conto é permeado por símbolos: há a alusão ao jardim ou pomar, que evoca o Paraíso

bíblico; há a interdição às crianças, ou aos não-iniciados, da experiência das

delícias e dores do conhecimento; há os diversos motivos ocultistas que ligam à

paixão física à Paixão mística, como a rosa e seus espinhos. O erotismo não se

expressa explicitamente, portanto, mas na escolha dos objetos roubados: rosas e

pitangas; no motivo elementar e ausente do roubo: roubava simplesmente para possuir

as rosas, para comer as pitangas; mas, sobretudo, nas descrições ardentes e sensuais

da flor e do fruto, cuja adjetivação generosa não deixa dúvidas quanto ao papel

alegórico desses elementos na narrativa: A flor soberana, de pétalas grossas e

aveludadas, com vários entretons de rosa-chá. No centro dela a cor se concentrava e

seu coração quase parecia vermelho. Vermelho como as pitangas, que escondidas na

folhagem era preciso buscar às apalpadelas cegas, até sentir o úmido da frutinha.

O colher das pitangas, que muitas vezes, na sua pressa, deixava-lhe os dedos

como ensangüentados, imagem que também é utilizada na descrição da colheita da

rosa: Finalmente começo a lhe quebrar o talo, arranhando-me com os espinhos, e

chupando o sangue dos dedos, chega a sugerir sucessivos defloramentos, dedução

que a autora reforça no último parágrafo, quando diz que as pitangas pedem para

ser colhidas, em vez de amadurecer e morrer no galho, virgens.

Não deixa de ser estranho a autora atribuir à menina o papel de defloradora de

virgens. Mas não há como negar que a descrição das rosas e das pitangas são

sugestivas evocações do órgão sexual feminino. A evidência da proibição e a

presença marcante de uma culpa que deveria, mas não é sentida, são contrapostas

à excitação do roubo e à detalhada descrição do processo, feito a duas: a menina

vigiando, eu entrando, eu quebrando o talo e fugindo com a rosa na mão. Sempre

com o coração batendo e sempre com aquela glória que ninguém me tirava. A

satisfação do resultado contribui para a perpetuação da brincadeira: Foi tão

bom. Foi tão bom que simplesmente passei a roubar rosas.

Uma confissão íntima, velada, de algum jogo sexual infantil, arrancado

alegoricamente à memória culpada (por não sentir culpa) da mulher adulta? Um texto

ocultista, que esconde na aparente simplicidade do tema uma mensagem vedada aos

não-iniciados? Uma alusão metalingüística à natureza do exercício do seu mestrado

literário? Não me arrependo diz ela, afinal. Ladrão de rosas e de pitangas

tem cem anos de perdão.

Explicação:

Espero ter ajudado.


gih565: obrigada
cbmgias: de nada
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