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O PADEIRO
Geralmente as crônicas tratam de assuntos do cotidiano.
Rubem Braga escreveu diversas crônicas sobre assuntos
aparentemente simples, mas sempre com uma visão
especial. A crônica a seguir, foi escrita em 1.956, fala de
dois tipos de trabalhador, de como eles trabalhavam há
sessenta anos. Conheça o olhar do cronista a respeito.
Levanto cedo, faço minhas abluções, ponho a chaleira
no fogo para fazer café e abro a porta do apartamento -
mas não encontro o pão costumeiro. No mesmo instante
me lembro de ter lido alguma coisa nos jornais da véspera
sobre a "greve do pão dormido”. De resto não é bem uma
greve, é o lockout, greve dos patrões, que suspenderam o
trabalho noturno; acham que obrigando o povo a tomar
seu café da manhã com pão dormido conseguirão não sei
bem o que do governo.
Está bem. Tomo o meu café com pão dormido, que não
é tão ruim assim. E enquanto tomo café vou me lembrando
de um homem modesto que conheci antigamente. Quando
vinha deixar o pão à porta do apartamento ele apertava a
campainha, mas, para não incomodar os moradores,
avisava gritando:
-- Não é ninguém, é o padeiro!
Interroguei-o uma vez: como tivera a ideia de gritar
aquilo?
"Então você não é ninguém?"
Ele abriu um sorriso largo. Explicou que aprendera
aquilo de ouvido. Muitas vezes lhe acontecera bater a
campainha de uma casa e ser atendido por uma empregada
ou outra pessoa qualquer, e ouvir uma voz que vinha lá de
dentro perguntando quem era: e ouvir a pessoa que o
atendera dizer para dentro: "não é ninguém, não senhora,
é o padeiro". Assim ficara sabendo que não era ninguém...
Ele me contou isso sem mágoa nenhuma, e se
despediu ainda sorrindo. Eu não quis detê-lo para explicar
que estava falando com um colega, ainda que menos
importante. Naquele tempo eu também, como os padeiros,
fazia o trabalho noturno. Era pela madrugada que deixava a
redação de jornal, quase sempre depois de uma passagem
pela oficina - e muitas vezes saía levando na mão um dos
primeiros exemplares rodados, o jornal ainda quentinho da
máquina, como pão saído do forno.
Ah, eu era rapaz, eu era rapaz naquele tempo! E as
vezes me julgava importante porque no jornal que levava
para casa, além de reportagens ou notas que eu escrevera
sem assinar, ia uma crônica ou artigo com o meu nome. O
jornal e o pão estariam bem cedinho na porta de cada lar; e
dentro do meu coração eu recebi a lição de humildade
daquele homem entre todos útil e entre todos alegre; "não
é ninguém, é o padeirol".
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essa não sei difícil em
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