Resolvi andar um pouco a pé, ir até o supermercado. Quando eu passava em frente aos portões, soava um alarme e luzes se acendiam. Fiquei brincando de gato e rato com as portas tão sensíveis, mas foi me dando uma raiva burra. Acreditam que me senti excluída e empurrada para fora daqueles prédios?
Não deveria ter sido surpresa. É que sou muito distraída. Quando vou a uma festa feita por nós do bufê, passo por problemas incríveis. Basta o porteiro enxergar uma velha de cabelos brancos que se diz cozinheira, na chuva, sobem-lhe à cabeça suspeitas terríveis de assalto e mulher-bomba Escondido atrás de um vidro blindado fumê, pede a identidade que devo inserir numa fenda, de onde cairá na caixinha dele.
Começo a vislumbrar, atrás do escuro, um sujeito atarracado, mordendo a ponta da caneta, olhos entrefechados. Escreve e lê com dificuldade. Acho que tão avançada técnica contra ladrões mereceria um Nero Wolfe, um Perry Mason, um Sherlock Homes. Inúmeras vezes já cansei ao ser recolocada numa segunda jaula, e daí desisto. Brado: “Não entro, mas não tem festa”. Costuma ser um abre-te sésamo. O engraçado é que, todas as vezes que consigo chegar, adivinhem quem já está lá me esperando há 40 minutos? O senhor Zé, nosso motorista de longa data, que tem a maior cara de mexicano, bigodes revirados e olhar furtivo. Ele, sim, sabe das coisas.
Claro que entendo que a segurança é necessária. Mas o problema que tenho para aceitar as ruas fechadas... As ruas do meu bairro, as vilas do meu bairro. Onde foi parar o meu bairro? Se tenho que morrer de pneumonia ou sarampo, morro de ladrão, mas não abdico da rua. O que perderam meus netos por não conhecerem seus vizinhos? Por terem perdido dona Judith, que fazia gefilte fish? Sem contar dona Seraphita, com suas inefáveis balas de ovos. Sem contar Natália, a italianinha, esta sim, que me deu o maior prazer de todos, ensinando-me furtivamente como se fazia um sanduíche de alho cortado fininho, um pingo de sal e bastante azeite. O meu bairro era a ONU, era o que nos transformava em cidadãos do mundo, era o que nos ensinava a enfrentar a vida de patins e bicicleta, era o mundo lá fora que trazíamos para exame dos pais. A rua educa, todos misturados na mesma tigela.
(Folha de São Paulo, Ilustrada, E5, 2 ago. 2007. Adaptado.)
No trecho “... não abdico da rua”, o termo destacado pode ser corretamente substituído por
abro mão.
falo mal.
me esqueço.
me aproximo.
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abro mao letra A
fiz isso na minha prova.é acertei
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