Entre silêncios e diálogos
Bartolomeu Campos de Queirós
Havia uma desconfiança: o mundo não terminava onde os céus e a terra se encontravam. A extensão do meu olhar não podia determinar a exata dimensão das coisas que existiam. Havia o depois. Havia o lugar do sol se aninhar enquanto a noite se fazia.
Existia um abrigo para a lua enquanto era dia. E o meu coração de menino se afogava em desesperança. Eu que não era marinheiro nem pássaro - sem barco e asa.
Um dia aprendi com Lili a decifrar as letras e suas somas. [Ela me ensinava com muito carinho]. E a palavra se mostrou como caminho poderoso para encurtar distância, para alcançar onde só a fantasia suspeitava, para permitir silêncio e diálogo.
Com as palavras eu ultrapassava a linha do horizonte. [E ela já não era tão distante assim]. E o meu coração de menino se afagava em esperança. Ao virar uma página do livro, eu dobrava uma esquina, escalava uma montanha, transpunha uma maré, [tudo isso apenas virando uma página do livro].
Ao passar uma folha, eu frequentava o fundo dos oceanos, transpirava em desertos para, em seguida, me fazer hóspede de outros corações.
Pela leitura temperei a minha pátria, chorei sua miséria, provei de minha família, bebi de minha cidade, enquanto, pacientemente, degustei dos meus desejos e limites.
Assim, o livro passou a ser o meu porto, a minha porta, o meu cais, a minha rota. Pelo livro soube da história e criei os avessos, soube do homem e seus disfarces, soube das várias faces e dos tantos lugares de se olhar. (...) Ler é aventurar-se pelo universo inteiro. (Adaptado)
Campos de Queirós, Bartolomeu. Sobre ler, escrever e outros diálogos. Belo Horizonte: Autêntica, 2012, p. 63.
Segundo o autor, a leitura foi fundamental para que o seu coração de menino deixasse de se afogar em desesperança e passasse a se afagar em esperança. De acordo com o contexto, como se deu esse processo? Explique.
Respostas
Resposta:
a) A metáfora “a minha rota” resume o sentido de orientação, do rumo tomado pela vida pelo enunciador: o livro
assume a função de instrumento moderador da vida.
b) A mudança em questão se refere ao alcance de maturidade pessoal por parte do enunciador: somente após
tornar-se leitor o enunciador pôde degustar dos próprios “desejos e limites”, enquanto chorava a “miséria” de sua
pátria. Da descoberta madura dos próprios limites e da compreensão do espaço coletivo, o enunciador conseguia se
aventurar “pelo universo inteiro”.
Explicação:
De acordo com o contexto em que a história acontece, temos que o marinheiro conseguiu livrar o seu coração de sentimentos ruins através da leitura, que o "salvou".
Interpretação do texto "Entre silêncios e diálogos"
Para o narrador e também personagem principal desta história, a leitura foi algo que tirou o marinheiro de uma possível solidão e também de uma "maré" de sentimentos ruins que viviam deixando-o aflito.
Pode-se afirmar que o ato de praticar a leitura se configura como uma prática social, onde interagimos com diferentes pensamentos, ideias, maneira diversificadas de expressões e demais conteúdos produzidos pelos autores de textos.
Saiba mais sobre leitura em: brainly.com.br/tarefa/35420079
