Alguém é mais triste? Remédio nele. Deprimido? Remédio nele (ainda que tenha acabado de perder uma
pessoa amada, um emprego, a saúde). Mais gordinho? Dieta nele. Mais alto? Remédio na adolescência para
parar de crescer. Mais relaxado na escola? Esse é normal. Mais estudioso, estudioso demais? A gente se
preocupa, vai virar nerd (se for menina, vai demorar a conseguir marido).
Não podemos, mas queremos tornar tudo homogêneo: meninas usam o mesmo cabelo, a mesma roupa, os
mesmos trejeitos; meninos, aquele boné virado. Igualdade antes de tudo, quando a graça, o poder, a força
estão na diversidade. Narizes iguais, bocas iguais, sobrancelhas iguais, posturas iguais.
Não se pode mais reprovar crianças e jovens na escola, pois são todos iguais. Serão? É feio, ou vergonhoso,
ter mais talento, ser mais sonhador, ter mais sorte, sucesso, trabalhar mais e melhor.
Vamos igualar tudo, como lavouras de repolhos, se possível... iguais. E assim, com tudo o que pode ser
controlado com remédios, nos tornamos uma geração medicada. Não todos -- deixo sempre aberto o espaço
da exceção para ser realista, e respeitando o fato de que para muitos os remédios são uma necessidade --,
mas uma parcela crescente da população é habitualmente medicada.
Remédios para pressão alta, para dormir, para acordar, para equilibrar as emoções, para emagrecer, para ter
músculos, para ter um desempenho sexual fantástico, para ter a ilusão de estar com 30 anos quando se tem
70. Faz alguns anos reina entre nós o diagnóstico de déficit de atenção para um número assustador de crianças.
Não sou psiquiatra, mas a esta altura de minha vida criei e acompanhei e vi muitas crianças mais agitadas, ou
distraídas, mas nem por isso precisadas de medicação a torto e a direito. Fala-se, não sei em que lugar deste
mundo doido, em botar Ritalina na merenda das escolas públicas. Tal fúria de igualitarismo esconde uma
ideologia tola e falsa.
Se déssemos a 100 pessoas a mesma quantidade de dinheiro, e as mesmas oportunidades, em dois anos
todas teriam destino diferente: algumas multiplicariam o dinheiro; outras o esbanjariam; outros o guardariam;
outras ainda o dedicariam ao bem (ou ao mal) alheio.
Então, quem sabe, querer apaziguar todas as crianças e jovens com medicamentos para que não estorvem os
professores já desesperados por falta de estímulo e condições, ou para permitir aos pais se preocuparem
menos, ou ajudar as babás enquanto os pais trabalham ou fazem academia ou simplesmente viajam, nem
valerá a pena.
Teremos mais crianças e jovens aturdidos, crianças e jovens mais violentos e inquietos quando a medicação
for suspensa. Bastam, para desatenção, agitação e tantas dificuldades, relacionadas, as circunstâncias de vida
atual.
Recentemente, uma pediatra experiente me relatou que a cada tantos anos aparecem em seu consultório mais
crianças confusas, atônitas, agitadas demais, algumas apenas sofrendo por separações e novos casamentos,
em que os filhos, que não querem se separar de ninguém, são puxados de um lado para o outro, sem casa
fixa, um centro de referência, um casal de pais sempre os mesmos.
Quem as traz são mães ou pais em igual estado. Correrias, compromissos, ansiedade por estar na crista da
onda, por participar e ser o primeiro, por não ficar para trás, por não ser ignorado, por cumprir os horários, as
prescrições, os comandos, tudo o que tantas pressões sociais e culturais ordenam, realmente estão nos
tornando eternos angustiados e permanentes aflitos.
Mudar de vida é difícil. Em lugar de correr mais, parar para pensar, roubar alguns minutos para olhar,
contemplar, meditar, também é difícil, pois é fugir do padrão. Então seguimos em frente, nervosos com nossos
filhos mais nervosos. Haja psicólogo, psiquiatra e medicamento para sermos todos uns repolhos iguais.
(Lya Luft - "Revista Veja" - São Paulo)
01) No fragmento "Não se pode mais reprovar crianças e jovens na escola, pois são todos iguais. Serão?", a
estrutura em destaque traduz:
(A) a dúvida em relação à veracidade dessa igualdade que tanto se busca.
(B) a importância que a sociedade moderna atribui à diversidade.
(C) uma crítica às escolas que ainda admitem a reprovação.
(D) a ideia de um futuro próximo em que ocorrerá a supervalorização do igualitarismo.
02) Com base na leitura do texto, considere as afirmativas seguintes e assinale com V as verdadeiras e com
F, as falsas:
( ) Existe, hoje, uma banalização do uso de medicamentos, os quais atuam como instrumentos de cura nas
situações mais inusitadas.( ) A fragilidade dos laços afetivos na família, respaldada pela diversidade de pressões sociais e culturais, tem
responsabilidade na angústia e na aflição que caracterizam, atualmente, as pessoas.
( ) A fuga ao padrão pré-estabelecido é difícil porque significa posicionar-se contra a corrente.
( ) A igualdade só traz benefícios às pessoas, pois evita os conflitos.
( ) Na ansiedade de obedecer aos padrões
Respostas
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Resposta:
que burrisee claro que tem remédio e uma farmácia tem quer te remédio
Explicação:
hahahahaa
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