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colonialismo foi mais do que um sistema de exploração econômica e de dominação política, podendo mesmo ser entendido como um modo de percepção do mundo e de enquadramento da vida social. Este número especial do Anuário Antropológico discute as categorias geradas pelo colonialismo. Reunindo pesquisas cujo enfoque recai sobre as experiências coloniais em África, as contribuições agregadas neste volume analisam os mapas mentais elaborados por uma variedade de sujeitos no intuito de orientar a navegação na paisagem colonial africana. Igualmente, fornecem subsídios para uma reflexão crítica sobre o que restou desse modo de enquadrar o mundo depois das descolonizações.
2Os estudos históricos sobre a presença europeia em África, bem como os eventos contemporâneos que recorrentemente descortinam aos olhos do mundo as feridas abertas deixadas naquele continente pelos projetos imperialistas, não permitem minimizar a violência explícita das ações de subjugação política e de extração de recursos que acompanharam o colonialismo. O que os estudos coloniais e pós-coloniais têm demonstrado, porém, sobretudo aqueles realizados a partir da década de 1990, é que tais dimensões dos projetos imperialistas devem ser vislumbradas através de uma nova lente (ver, especialmente, Comaroff & Comaroff, 1991, 1997; Cooper & Stoler, 1997a). Num sentido mais amplo, o colonialismo passa a ser entendido como um evento que alcançou os domínios mais insólitos das práticas cotidianas, os mais recônditos cantos da vida social. Como produto de um complexo encontro que alterou a tudo e a todos (Comaroff & Comaroff, 1997), trata-se de “um processo histórico totalizante, instituidor de uma hegemonia orientadora da percepção e da experiência social” (Trajano Filho, 2004:23).
3Em outras palavras, o esforço conjunto da historiografia e da antropologia realizado nas últimas décadas tem levado a um exame do colonialismo como um processo que atuou, “simultaneamente, igualmente e inseparavelmente”, na economia política e na cultura (Comaroff & Comaroff, 1997:19). Economia política e cultura são, portanto, aspectos de uma mesma realidade. O colonialismo está relacionado ao evento histórico do capitalismo industrial e aosimperativos materiais da modernidade, ao mesmo tempo que atravessa o campo das representações, dos discursos e dos valores. Como tal, foi experienciado, pela pluralidade de sujeitos envolvidos, na totalidade da vida social e na própria definição dos termos em que essa realidade se apresentava à experiência, classificando-a e hierarquizando-a.