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Nos últimos tempos, os estudos sobre gênero aparecem junto a uma gama de temas da História que eram recorrentemente marginalizados e agora ganham grande fôlego nos meandros da academia. Em termos práticos, isso colocou em evidência a figura da mulher enquanto personagem histórico e deu voz a ela em um extenso conjunto de contextos em que a figura masculina parecia dirigir todas as ações que vieram a estabelecer o que já aconteceu.
Essa tentativa de deixar a escrita da história um tanto quanto machista parece ser mais extensa do que parece, principalmente quando nos aventuramos no interior da Pré-História. Durante muito tempo, os estudos de arqueólogos, paleontólogos e historiadores restringiram o mundo pré-histórico ao mundo dos “homens das cavernas”. Isso não apenas por uma questão de nomenclatura, mas também porque a maciça maioria dos fósseis encontrados era presumidamente do sexo masculino.
Tal situação mudou com a descoberta de Lucy e Luzia, dois fósseis femininos que estabeleceram uma quebra nessa curiosa hegemonia máscula do período. No entanto, a grande parte das descrições sobre a mulher pré-histórica – inicialmente produzida no século XIX – tinha o costume de naturalizar a ideia de que o ambiente dessa personagem histórica era doméstico e familiar. Com isso, teríamos uma naturalização da própria situação que a grande parte das mulheres vivenciava no século XIX. Mas seria isso que os fósseis teriam a dizer?
Nas pesquisas mais recentes, vemos que esse papel limitado da mulher não passou de uma grosseira reprodução dos valores patriarcais que dominavam as ciências que fundamentam o conhecimento pré-histórico. Já antes da descoberta da agricultura, temos vestígios de que as mulheres tinham um papel ativo no processamento da caça. Vestígios analisados mostram que as mulheres auxiliavam no corte das carnes e no deslocamento dos animais que eram mortos com fins alimentares.
Além disso, podemos ter situações em que as mulheres eram as grandes responsáveis por “colocar comida dentro de casa”. Ainda no neolítico, nos períodos em que as atividades de caça se mostravam em baixa, a coleta de folhagens, frutos e raízes comestíveis acabavam garantindo o sustento de todo um grupo. Chegando ao período Paleolítico, temos na Austrália a presença de vestígios de pinturas, atividades artesanais e a fabricação de armas com comprovada autoria feminina.
Sendo assim, os vestígios desta época acabaram aquecendo o debate que visa delimitar em termos culturais e biológicos a diferença entre os homens e as mulheres. Por outro lado, percebemos que a revisão sobre o passado das mulheres merece uma revisão bem maior do que um dia pudéssemos imaginar. Afinal, para quem não se lembra, a Pré-História é o período histórico de maior extensão na trajetória dos homens... e das mulheres.