CRÔNICA - MENOS PLÁSTICO, MAIS AMOR Eu provavelmente estava distraída quando os guardanapos das lanchonetes começaram a vir em invólucros de plástico. Você precisa abri-los antes de sujar as mãos, senão pode ser tarde e complicado demais. Isso me deixa irritada todas as vezes. Embora essa questão de natureza prática seja importantíssima, não é sobre ela que eu gostaria de falar. O que me intriga de fato é em que momento e por que nós começamos a exagerar tanto no uso das coisas plásticas (copos, pratos, mexedores, embalagens para um único canudo). Vou chamar o fenômeno de hiperassepsia. Será que alguém morreu por um guardanapo contaminado, e eu não fiquei sabendo? E quanto ao copo descartável que acompanha a garrafa também descartável, nós precisamos mesmo dele? E do prato de plástico contendo um muffin que por sua vez, já está devidamente protegido por uma redoma cujo rápido destino é o lixo? E o que fazer dos seis saquinhos de shoyu ofertados por um único temaki? Quando as tele-entregas japonesas me mandam um pote de gosma verde sem perguntar (não gosto de wasabi, eu diria lamento), tenho pontadas no coração pensando em todo aquele plástico desperdiçado. Talvez eu possa esboçar duas razões para esse excesso de itens destinado às lixeiras. Em primeiro lugar, em tempos de álcool gel, é natural que um dispensador de canudos nos pareça uma monstruosa colônia de germes. Melhor embalá- los um a um. Não custa lembrar, no entanto, que nesse exato momento, na França, há um funcionário recebendo uma nota de cinco euros e depois entregando um sanduíche a alguém com aquelas mesmas mãos sem luvas. Como bons brasileiros que contraíram a hiperassepsia, a cena pode nos causar caretas de nojo, mas provavelmente revela mais sobre diferenças culturais e menos sobre reais riscos à saúde. Em segundo lugar, e mais importante: o exagero dos plásticos parece estar ligado à tendência de querer agradar a qualquer custo. Pela natureza um tanto infantilizada dessa relação estabelecimento-cliente, talvez seja mais adequado usar a palavra mimar. Só isso pode explicar o que observo cotidianamente nos caixas de supermercado. Embora a maioria de nós seja perfeitamente capaz de pôr objetos dentro de uma sacola, nós temos empacotadores. E você já percebeu que esses empacotadores são instruídos a não colocar no mesmo saco uma pasta de dente e um pacote de biscoitos? A consequência disso é o uso de uma quantidade absurda de sacolas. Eu me pergunto que tipo de horror aconteceria caso esses itens, bem seguros dentro de suas respectivas embalagens, dividissem o mesmo espaço. Na minha sacola de pano, sob os olhos atônitos do empacotador que acabo de dispensar, é claro que tudo vai misturado. Continuo viva!
Questões:
1. Releia o primeiro parágrafo da crônica para responder às questões:
a. Por que a narradora diz que devia estar distraída “quando os guardanapos das lanchonetes começaram a vir em invólucros de
plástico”?
b. Qual é a primeira desvantagem que a narradora aponta nessa mudança?
c. Embora a narradora inicie o texto falando de um incômodo pessoal, ela deixa claro que falará sobre um assunto mais abrangente.
Que assunto é esse?
2. Cite dois exemplos do uso de produtos plásticos que a narradora descreve, a fim de reforçar o argumento de que ocorrem exageros.
3. Releia outro trecho da crônica, no qual se descreve uma situação em uma lanchonete francesa: “Não custa lembrar, no entanto, que
nesse exato momento, na França, há um funcionário recebendo uma nota de cinco euros e depois entregando um sanduíche a alguém
com aquelas mesmas mãos sem luvas”.
a. Por que se descreve uma situação que, objetivamente, não pode comprovar que está ocorrendo de fato?
b. Em sua opinião, por que a autora teria escolhido a França como cenário para tal situação?
4. Releia o trecho: “Você precisa abri-los antes de sujar as mãos, senão pode ser tarde e complicado demais”. Ao usar o pronome você,
a autora se refere a alguém específico? Explique.
5. Você se identifica com a forma da cronista se posicionar a respeito do uso do plástico em seu cotidiano? Em sua opinião, em quais
situações o uso do plástico poderia ser evitado?
Respostas
1) a) A distração da narradora se refere a momentos passados, em que não existiam os plásticos para envolver os guardanapos, ou eram envoltos em papel ou era apenas colocados em suportes.
B) A mudança na utilização do plástico para guardanapos dificulta a utilização para aqueles que se encontram com as mãos sujas.
C) O assunto é a grande utilização de plásticos.
2) A autora cita a utilização de plásticos para envolver guardanapos, a grande quantidade de saquinhos plásticos de shoyu e pratos de plásticos contendo um muffin.
3) a) Para contrapor o chamado "fenômeno da hiperassepsia", de forma a exemplificar.
b) Possivelmente o exemplo pode ter relação com o estereótipo que envolve os franceses, que são anti-higiênicos.
4) A autora se refere aos leitores em geral, não sendo específico.
5) Sim, a utilização do plástico poderia ser evitada por exemplo em embalagens de entrega, em que muitas vezes a encomenda é envolta em uma grande quantidade de plástico que não possui muita utilidade, podendo ser substituída por outro material.