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Não hesito em dizer que a Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, fruto de uma evolução de pelo menos sete séculos, representou um marco histórico em matéria de ética.
Nas diferentes civilizações da antiguidade, cada povo considerava seus valores éticos, consolidados em costumes tradicionais, como superiores aos dos demais povos, os quais eram tidos, por isso mesmo, como bárbaros, senão como inimigos. Além disso, no mundo antigo os indivíduos achavam-se absorvidos no grupo social, não tendo praticamente nenhuma autonomia de vida e atuação.
A Declaração Universal de 1948 veio alterar radicalmente essa concepção ética, ao proclamar, desde o seu artigo de abertura, que “todos os seres humanos nascem livres e iguais, em dignidade e direitos”. Se todos nós, humanos, possuímos a mesma dignidade, nenhum povo, etnia, grupo religioso ou gênero sexual pode se considerar superior aos outros. Além disso, essa situação de substancial igualdade humana passou a concretiza-se em direitos; vale dizer, na capacidade reconhecida a cada qual – indivíduo ou grupo social – de exigir dos demais o respeito à sua dignidade.
Com isso, a Declaração Universal dos Direitos Humanos veio anunciar a abertura de uma nova era na evolução histórica: a unificação da humanidade. Superando as divisões tribais, nacionais, étnicas ou religiosas, passamos todos a ter consciência de que formamos um só grupo na face da Terra, unido pela condição de natural solidariedade. Tudo o que prejudica um indivíduo, povo ou etnia prejudica também, necessariamente, a humanidade inteira.
Mas a História, obviamente, não cessa de evoluir. A partir de 1948, duas novas dimensões de direitos humanos surgiram, e passaram a ser objeto de documentos internacionais.
A primeira delas diz respeito ao chamado direito à diferença. Com efeito, se reconhecemos, de um lado, que a nossa espécie comporta dois sexos, cada qual com peculiaridades próprias e igualmente respeitáveis, e se, de outro lado, verificamos que possuímos, todos, uma capacidade de permanente criação cultural, é impossível negar que somos, pela nossa essência, diferentes uns dos outros. Em 27 de novembro de 1978, na Declaração sobre Raça e Preconceito Racial, a UNESCO, reiterando que nenhum povo pode considerar-se superior aos demais, afirmou que “todos os povos têm o direito de ser diferentes, de se considerarem diferentes e de serem vistos como tais”.
A segunda dimensão dos direitos humanos, reconhecida posteriormente à Declaração Universal de 1948, é a existência de direitos dos povos e de direitos da humanidade. Dentre os primeiros, declarados, por exemplo, na Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Direitos dos Povos de 1981, figuram o direito dos povos a uma existência livre e autônoma, bem como o direito ao desenvolvimento, à paz e à segurança.
Finalmente, quanto aos direitos da própria humanidade, devem ser lembrados, entre outros, o de preservação do meio ambiente mundial e o reconhecimento, como declarado pela UNESCO em 1999, de que o genoma humano constitui um “patrimônio da humanidade”, sendo, nessa condição, insuscetível de apropriação privada para fins empresariais, como se tentou obter, em inúmeras ocasiões.
Em suma, hoje, cada vez mais, tomamos consciência, pura e simplesmente, de que a preservação dos direitos humanos é uma condição sine qua non de sobrevivência da humanidade.