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Resumo sobre o filme "A caverna dos sonhos esquecidos"
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A quem não está habituado às técnicas documentais de Werner Herzog, pode haver algum estranhamento logo nas primeiras cenas de A Caverna dos Sonhos Esquecidos (Cave of Forgotten Dreams, 2010). Enquanto o cineasta e sua pequena equipe acessam ao interior da caverna Chauvet, na França, acompanhando pesquisadores e cientistas em uma expedição pelo mais antigo registro de pinturas pré-históricas de que se tem notícia, o alemão, com sua tradicional narração em off que acompanha as imagens, pede desculpas pela presença da equipe de produção à frente das câmeras – dando ao filme, assim, a liberdade de utilizar desde sombras e equipamentos de iluminação até planos que geralmente fariam parte de imagens de bastidores, e às vezes indo ainda mais além, fazendo em tela uma aproximação entre as restrições existentes e as soluções encontradas por ele para driblá-las. A quebra do limite cênico, embora pareça consequência da restrição espacial do terreno explorado e das regras que precisam ser seguidas para a captura das imagens (andar em linha, não pisar fora da estreita plataforma de metal construída sobre a terra, etc, o que praticamente impossibilita ocultar equipe e equipamentos), também ajuda a identificar a importância que o processo, que a expedição de filmagem e o próprio fato de estarem registrando em vídeo pela primeira vez o interior deste local histórico, possui para a experiência e para a discussão propostas.
A presença de Herzog em seus documentários, por si só, não é nenhuma novidade - nem a diluição entre processo e produto, registro e filme, uma característica dos documentários do cinema verdade, embora sejam utilizadas neles de forma diferente da que faz o alemão em suas obras. Herzog participa ativamente como personagem, com voz e corpo, desde suas experiências iniciais com o gênero - em uma de suas primeiras verdadeiras obras-primas documentais, O Grande Êxtase do Escultor Steiner (Die große Ekstase des Bildschnitzers Steiner, 1974), alguns dos melhores momentos já ocorriam justamente quando o filme voltava-se à reação de Herzog à história registrada, como quando o diretor, no topo de uma montanha, encontra-se atônito ao avistar de longe o acidente de seu protagonista, um saltador de esqui, sem poder interagir com a ação nem saber o que realmente aconteceu. Mas talvez nenhum de seus filmes seja tão intrinsecamente pensado para esta diluição, para a existência de um processo de registro acontecendo em cena - não tanto enquanto efeito audiovisual, embora ele exista, mas enquanto dispositivo de discurso; um discurso que, aqui, abrange seu próprio fazer artístico para propôr uma reflexão sobre a expressão do homem, os efeitos do tempo nela e a importância da arte para a interpretação dos períodos da história e das mudanças comportamentais e culturais da humanidade.
Mas não é na busca de conclusões sobre estas questões que estão as intenções de Herzog, que utiliza-se novamente do documentarismo como forma também de explorar seus temas favoritos, vistos tanto nos filmes documentais quanto em sua obra de ficção: os sonhos grandiloquentes e as particularidades excêntricas dos seres humanos em choque com a vastidão, as dificuldades e os segredos da natureza terrestre. Ao conseguir liberação do Ministério da Cultura francês para registrar as pinturas encontradas na caverna Chauvet, mantidas como um tesouro trancado por grossas portas de ferro durante quase duas décadas, Herzog mira sua lente para o que é considerada a primeira evidência de arte humana - e, por isso, o princípio da existência do homem moderno, capaz não apenas de encontrar meios de sobreviver em nosso mundo, mas também de expressar sua interação com ele, seus sentimentos conflituosos e particulares perante a ele, tornar as experiências vividas em um pedaço da história que permanece marcado como tatuagens nas rochas das cavernas - um processo que nos dias de hoje, no artificialismo do mundo moderno, como insinuado pelo surreal epílogo filmado em uma Usina Nuclear existente próximo da caverna, ocorre na maior parte dos casos virtualmente, exatamente como faz Herzog com sua visita àquele local para registrá-lo em um filme digital.