• Matéria: Português
  • Autor: nicolearedes4
  • Perguntado 7 anos atrás

LIQUIDAÇÃO

A X lhe disseram que devia guardar seu dinheirinho no banco. É simples, cômodo, garantido. Ele não tinha propriamente o que guardar, mas ordenado não se gasta de pancada; depositá-lo, assinar alguns pequenos cheques, deixar um saldo bruxuleante para o mês seguinte: isso lhe dava um certo prazer bancário, que X ia cultivando. Resultado: no fim de algum tempo, tal o poder germinativo do capital, tinha o que se chama “dinheiro no banco”. Não muito, o bastante para viver quinze dias de barriga para o ar, contando nuvens.

Indo para o trabalho, contemplava o banco, sem volúpia de avarento, mas satisfeito: ali estava seu cobrinho, para qualquer emergência: viagem de pobre, operação, uma dessas máquinas americanas que a mulher sempre julga imprescindível adquirir, e que vão secando o rio Paraíba.

Surpreso, certa manhã viu uma fila agitada em frente ao banco que cerrara as portas. No dia seguinte, uma sigla qualquer do Banco do Brasil, pelos jornais, anunciava a liquidação do estabelecimento e esclarecia que, pelo decreto tal, de tantos de tantos, os depositantes de menos de cem mil cruzeiros receberiam imediatamente o seu dinheiro. Magnânimo decreto! X viu que a casa se reabrira, entrou.

- Dentro de sete dias o senhor será atendido.

Bem, não há prazo de funcionamento para os advérbios. Imediatamente, em linguagem bancária oficial, quer dizer: daqui a uma semana. Finda esta, imediatamente passou a significar quinze dias. E converteu--se em um mês, dois, regressou a 15 dias, oscilou algum tempo na zona indeterminada de “a qualquer momento” e estabilizou-se na acepção nebulosa de “não podemos informar”. O banquinho assumira feição kafkiana.

Abria-se todos os dias, para nada. Os ex-empregados (dispensados e readmitidos a título precário) ocupavam suas carteiras, ficavam esperando. O quê? Não havia negócios, o cofre estava lacrado, os clientes queriam apenas receber, mas isso só se faria imediatamente, isto é, quando Deus fosse servido.

Como é difícil liquidar um banco! Quanto mais um país, meditava ele, e isso lhe dava conforto cívico, em outra sorte de preocupações.

Veio a “emergência” e X, com dinheiro no banco, teve de pedi-lo emprestado a outro. Um dia, a sigla chamou-o pelo jornal. Foi, assinou um documento em que declarava tudo aquilo que o banco estava farto de saber: nome, endereço, saldo da conta corrente, etc., e outras coisas que não lhe haviam perguntado ao abrir-lhe a conta: se era casado, em que regime, etc.

- Agora vou receber?

- Daqui a 10 dias.

O advérbio se esticou de novo, de novo chamaram X, deram-lhe uma ficha que o habilitava a reaparecer dentro de cinco dias e a assinar sete papéis com duas testemunhas e firmas reconhecidas. Carimbaram tudo e mandaram X ao Banco do Brasil.

No B.B., deram-lhe um papelinho e um caderno de cheques.

- Que é isso?

- É a sua conta-corrente no B.B.

- Mas eu não tenho conta aqui.

- O senhor assinou um instrumento de cessão de direitos em quatro vias, e não se lembra disso?

Como toda gente, em todo o mundo, X assinara sem ler e agora estava preso ao B.B., engrenagem que sempre lhe inspirara majestoso pavor. Perguntou timidamente se poderia sacar quando quisesse. Sorrindo, disseram-lhe que sim. Pela dúvida, X encheu logo um cheque na importância total do saldo, rasgou os demais, recebeu o cobre e saiu correndo, com duas noções adquiridas: lugar de dinheiro é debaixo do colchão, e decreto de governo é brincadeira com dicionário.

(Carlos Drummond de Andrade, em “Fala , Amendoeira “ )



“Surpreso, certa manhã viu uma fila agitada em frente ao banco que cerrara”

Sobre as formas verbais “viu” e “cerrara”, os respectivos empregos permitem o reconhecimento de que

A indicam, pela ordem, ação do presente e do passado.
B expressam, pela ordem, uma ação concluída e outra anterior a ela.
C configuram duas ações em desenvolvimento, no passado.
D indicam, pela ordem, as ideias de certeza e de dúvida, no passado.
E Expressam, pela ordem, ações do pretérito perfeito e do imperfeito do indicativo.

Respostas

respondido por: jalves26
1

Sobre as formas verbais “viu” e “cerrara”, a opção CORRETA é:

B) expressam, pela ordem, uma ação concluída e outra anterior a ela.

> A forma verbal "viu" está no pretérito perfeito do indicativo, que é usado para expressar ações totalmente concluídas no passado.

> A forma verbal "cerrara" está no pretérito mais-que-perfeito do indicativo, que é usado para expressar ações passadas anteriores a outra também no passado. Ou seja, a ação de cerrar ocorrer antes da ação de ver. As duas estão no passado, mais uma ocorreu antes da outra.

respondido por: andreluizgleal
1

Resposta:

letra e

Explicação:

A forma “reabrira”, do pretérito mais que perfeito, indica uma ação anterior a outra também do passado, no caso a de “entrar”, expressa por uma forma verbal do pretérito perfeito.


andreluizgleal: ja fiz essa questao para a minha escola
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