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Historicamente, a vida caipira teve início com o Bandeirismo, um movimento de desbravamento do interior do estado de São Paulo pelos colonizadores portugueses, no século XVI. Antonio Candido definiu como Paulistânia todo o eixo de expansão e difusão da cultura bandeirante. Região esta onde se fixou o que entendemos por cultura caipira. Os estados de São Paulo (principalmente o interior), Goiás, Mato Grosso do Sul, metade Norte do Paraná, parte de Tocantins, parte do Mato Grosso e regiões como Sul de Minas e Triângulo Mineiro, são os locais onde se ambientaram esses valores. As sucessivas adaptações por que passou o colonizador durante o bandeirismo fez com que a vida do caipira primitivo assimilasse e conservasse suas origens nômades e aventureiras, promovendo uma fusão entre a herança portuguesa e a herança dos nativos da terra. Essa característica de economia semi-nômade marcou a habitação, a dieta e o caráter do caipira paulista. Durante muito tempo (do século XVI ao século XVIII), esse estilo de vida predominantemente marcado pela segregação e rusticidades da vida rural representava uma economia fechada, voltada para a auto-suficiência respaldada pelos agrupamentos de vizinhança, na qual não fazia sentido o acúmulo de capital.
Mais recentemente, a partir do século XIX, a cultura caipira vivenciou a ascensão e a consolidação do modelo capitalista de economia, impulsionado pela revolução industrial, que concorreu para grandes transformações no modo de vida tanto do homem urbano como rural, manifestando os sintomas da crise social e cultural pelo qual ainda vive a sociedade. Assim, o caipira desse segundo momento histórico passou por grandes mudanças. Primeiro, como pequeno agricultor, não conseguia mais prover por inteiro as próprias necessidades alimentares, pondo fim ao regime de autossuficiência, devendo recorrer aos estabelecimentos comerciais da vila, incorporando assim, o sistema comercial das cidades e a necessidade de acumulação de capital para aquisição de bens materiais e novas tecnologias que facilitavam o trabalho no campo. A cultura caipira foi ainda marcada por uma vida lúdico-religiosa bastante intensa e importante dentro de sua organização social. As festas e as idas às igrejas nos finais de semana favoreciam o convívio social sinalizado por hábitos alimentares e religiosos, dialeto e músicas bastante peculiares a esse grupo.
chamada "cultura caipira" é fortemente caracterizada pelo bucolismo e pelo catolicismo popular decorrente das inovações do Concílio de Trento, uma religiosidade de rezadores, apoiada nos valores do compadrio, e por manifestações religiosas cujo calendário se combina com o calendário agrícola, como observou em suas importantes pesquisas Alceu Maynard Araújo, da Escola de Sociologia e Política de São Paulo. A mais importante manifestação da religiosidade caipira (e também da religiosidade sertaneja no Brasil) é a festa do Divino Espírito Santo, anualmente anunciada pelas casas da roça e pelos bairros rurais pelo grupo precatório da Folia do Divino.
O caipira tem um dialeto próprio ou "falar": o dialeto caipira, que preserva elementos do falar do português arcaico (como dizer "pregunta" e não "pergunta"; "breganha" e não "barganha") e, principalmente, do tupi, da língua geral paulista e do nheengatu. Os missionários do século XVI, particularmente os jesuítas, já haviam observado que os índios da costa tinham enorme dificuldade para pronunciar as consoantes dobradas das palavras portuguesas (como em "palha", "mulher", "colher", "orelha", "olhos" etc.) e as palavras terminadas em consoantes, como o infinitivo dos verbos. Organizada gramaticalmente pelo padre Anchieta, foi língua de conversação cotidiana e também língua literária, na qual foram escritos os primeiros poemas brasileiros e o primeiro teatro. A língua portuguesa era unicamente língua de repartição pública, das câmaras, da justiça e da correspondência oficial. A língua nheengatu foi proibida em 1727 pelo rei de Portugal. A imposição da língua portuguesa deu origem ao dialeto caipira, uma língua dialetal e não português errado como muitos supõem. Há obras literárias em que o dialeto caipira está fortemente presente, como em "Lereias", de Waldomiro da Silveira e nas obras de Otoniel Mota, Cornélio Pires e Amadeu Amaral, autor do fundamental "Dialeto Caipira". O dialeto caipira não é apenas uma língua, mas expressa também uma lógica e um modo de pensar e definir o mundo, de que a mais bela expressão é "Grande Sertão: Veredas", de João Guimarães Rosa.
Devido à dificuldade da pronúncia, a população caipira passou a falar a língua portuguesa (agora obrigatória) com sotaque nheengatu: "paia", "muié", "cuié", "oreia", "zoio", "fulô" etc., e "falá", "cantá", "pitá", "vê", "senti", "oiá", "rezá" etc.. A língua nheengatu ainda continuou sendo falada em casa pela população mestiça, não só a população pobre, mas também a elite, até pelo menos o começo do século XIX. Persiste, ainda hoje, em regiões do Mato Grosso e no Alto Rio Negro. Em São Gabriel da Cachoeira, no estado do Amazonas, o nheengatu é uma das três línguas oficiais, junto com o português e o baniwa: todos os atos oficiais são obrigatoriamente publicados nessas três línguas.
Amadeu Amaral, em seu estudo "Dialeto Caipira", diz, sobre os diversos falares do Estado de Minas Gerais: "No próprio interior deste Estado (Minas Gerais), se podem distinguir, sem grande esforço, zonas de diferente matiz dialetal: o Litoral; o chamado "Norte"; o Sul e a parte confinante com o Triângulo Mineiro."
O filólogo português Cândido de Figueiredo em sua obra "Lições Práticas de Língua Portuguesa", volume 1, publicada em 1891, comparou o "falar" do caipira de São Paulo com o do morador de Lisboa.
espero ter ajudado!