Da lamparina à energia elétrica
Tarine Silva Ribeiro
O sítio da vovó Valdenice fica em São João de Iracema, num lugar muito bonito, e o melhor
de tudo é que é pertinho da cidade. É para lá que eu vou nos finais de semana. No sábado passado,
eu resolvi ir ao sítio à noite. Eu já tinha atravessado a porteira quando, de repente, a luz se
apagou...mas pernas pra que te quero! Ao perceber que eu tinha medo de escuro, vovó caiu na
risada e resolveu me contar sobre a sua infância, onde apenas uma lamparina e a lua brilhante
iluminavam a singela casa de pau a pique onde morava com sua família. “O escuro não me
amedrontava, só incomodava um pouco na hora de ir para a privada que ficava afastada da casa:
eu tinha receio de cair no buraco.”
Eu nasci e fui criada na nossa pequena e sossegada São João de Iracema, mais
precisamente onde o Judas perdeu as botas, na calorenta região noroeste do Estado de São Paulo.
Antigamente, nossa cidade era conhecida como “Os Poços”, devido aos boiadeiros que aqui
passavam para abastecerem-se de água e refrescarem-se do calor do sertão agreste.
Na vila, a criançada só cuidava de duas coisas: brincar e aprender. Eu nunca mais consegui
me esquecer do dia emque a ranzinza da professora me colocou ajoelhada em cima dos grãos de
milho e me deu dois tapas na orelha. Que dureza era estudar naquela época!
Nas ruas de terra esburacadas eu me sentia livre e feliz. Divertia-me jogando terra em quem
passava, depois caía na gargalhada. Como naqueles tempos todo mundo era amigo de todo
mundo, as caras feias eram raras. Quando eu sentia o cheiro bom da comida feita por mamães no
fogão a lenha, ia correndo para casa encher a barriga. Que delícia!
O tempo foi passando devagar, pois aqui até o vento sopra lentamente... A vila foi virando
cidade e as casas de pau a pique foram sendo derrubadas e substituídas pelas de tijolos. Os
moradores faziam mutirão para ajudar. Em 1966, eu já estava com meus 12 anos, quando a cidade
acordou diferente: para meu espanto e de toda a população a energia elétrica havia chegado! Foi
um alvoroço, era o fim das lamparinas! Mais do que depressa o meu pai Ezequiel fechou a barbearia
e foi o primeiro morador da cidade a ir até Fernandópolis comprar um liquidificador e uma
televisão. A casa dos meus pais tornou-se a novidade do momento e ficou movimentadíssima: toda
hora os vizinhos queriam usar o
Liquidificador para bater sucos e assistir à televisão.
A danada da televisão era em branco e preto e só pegava um único canal. Quando ela
resolvia sair do ar o pessoal ficava vendo listras por um tempão; nem colocar bombril na antena
resolvia. Meu pai faleceu bem velhinho e em homenagem ao morador antigo o nome Ezequiel Pinto
Cabral foi colocado na rua onde eu passei a minha infância, bem em frente à praça da igreja matriz.
“Encho-me de saudade toda vez que passo por essa rua.”
Após abrir o seu coração, vovó, emocionada, me disse: “É, minha neta, apesar de ser do
tempo da lamparina, eu jamais poderia esquecer as recordações que ficaram na minha mente até
hoje”.
Nós sorrimos e ficamos abraçadas por um longo tempo. Desde então, perdi o medo do
escuro e percebi que apesar de a minha cidade ser simples e pequena no tamanho, com seus ummil oitocentos e cinquenta habitantes, ela é grande no meu coração e inesquecível na mente dos
moradores.
Tarine Silva Ribeiro.
Texto produzido em 2004 quando era aluna da
4ª- série da E. E. Professora Joanita B.B.Carvalho,
São João de Iracema– SP. Baseado na entrevista com Valdenice Cabral Minales Satin, 51 anos.
Entendendo o texto:
Em relação ao texto “Da lamparina à energia elétrica”, escrito por Tarine Silva Ribeiro, após fazer
uma leitura silenciosa e atenta, responder as questões de forma completa observando o seguinte:
O texto é composto por oito parágrafos sendo que, entre o primeiro e o último, ocorre o relato de
fatos da avó da narradora.
1. Por qual motivo a avó resolveu contar os fatos de sua infância à neta?
Respostas
respondido por:
1
1°) Ao notar que sua neta tinha medo do escuro, por estar acostumada com a energia elétrica, a avó resolveu contar como era sua infância na qual usava apenas uma lamparina e a luz da lua, afim de fazer sua neta não temer ao escuro.
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