O SISTEMA LITERÁRIO CONSOLIDADO Machado de Assis era dotado de raro discernimento literário e adquiriu por esforço próprio uma forte cultura intelectual, baseada nos clássicos, mas aberta aos filósofos e escritores contemporâneos. Apesar da condição social modesta, impôs-se aos grupos pela originalidade da obra e o vigor da personalidade discreta, a um reconhecimento público que raros escritores conseguiram no Brasil. Na velhice, era considerado a figura mais importante das letras e de uma veneração quase sem exceções. Sua obra é variada e tem a característica das produções satisfaz tanto aos requintados quanto aos simples. Ela tem, sobretudo, possibilidade de ser reinterpretada à medida que o tempo passa, tendo uma dimensão profunda de universalidade, funciona como se dirigisse a cada época que surge. Ele foi excelente jornalista, poeta e comediógrafo de certo interesse. Mas foi, sobretudo ficcionista, autor de nove romances e mais de uma centena de contos, quase sempre de alta qualidade. A melhor fase de sua produção começou na idade madura, quando atingiu os quarenta anos, mas desde o começo já eram pessoais o seu estilo e visão do mundo. Além de certas colectâneas de contos, como Papéis Avulsos (1882), Histórias sem Data (1884), Várias Histórias (1896), sobressaem na sua obra os seguintes romances: Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891), Dom Casmurro (1899), Esaú e Jacó (1904), Memorial de Aires (1908). Um dos traços salientes da narrativa de Machado de Assis é o afastamento das modas literárias, que lhe permitiu grande liberdade no tratamento da matéria. Ele é um continuador sui generis de Joaquim Manuel de Macedo e José de Alencar, quanto ao tipo de sociedade incorporada à ficção...Ele parece, por exemplo, contemplar com cepticismo a vida do seu tempo, e de fato assim é. No entanto, nos refolhos da frase, no subentendido das cenas, no esforço aparentemente casual da descrição, está escondido o interesse lúcido pela realidade social e o sentimento das suas contradições. Do mesmo modo, consegue despistar o leitor por meio de uma frieza irônica que pode significar desapreço pelo homem, mas pode ser também um método de afastamento, recobrindo a compreensão piedosa. Por causa dessa capacidade de fundir frieza e paixão, serenidade e revolta, elegância e violência, a sua escrita é um prodígio de elaboração, que, tendo-se despojado dos acessórios, é sempre moderna, apesar de raros traços de preciosismo. Graças à riqueza do seu texto, Machado de Assis é o primeiro narrador brasileiro que suporta uma leitura filosófica. Além disso, seus temas foram incrivelmente precursores, obrigando a crítica atual, para explicá-lo, a evocar autores que vieram depois, como Pirandello, Proust, Kafka, sem falar de seu contemporâneo Dostoievski. Note-se que talvez ele seja o primeiro escritor que teve noção exata do processo literário brasileiro, em alguns artigos de rara inteligência crítica. O ensaio “Instinto de Nacionalidade” (1873) faz um balanço das tendências nacionalistas, sobretudo o indianismo, mostrando que a absorção nos temas locais foi um momento a ser superado, e que a verdadeira literatura depende, não do registro de aspectos exteriores e modismos sociais, mas da formação de um “sentimento íntimo” que, embora fazendo do escritor um homem “do seu tempo e do seu país”, assegure a sua universalidade. Há nesse ensaio uma espécie de reivindicação tácita do direito à expressão liberada das injunções contingentes do nacionalismo estético, o que faz dele, como de outros escritos de Machado de Assis, um certificado de maioridade da literatura brasileira através da consciência crítica. Nesse tempo foi importante o desenvolvimento da crítica literária, orientada pela divulgação científica e pelos teóricos positivistas ou naturalistas (em sentido amplo), como Taine, que inspirou mais de uma geração brasileira. Sílvio Romero (1851-1914), ruidoso e combativo, preconizou o estudo da literatura pelos fatores externos e a personalidade do autor, vinculando a história literária a uma teoria da sociedade e da cultura com base no conceito de raça, que era então decisivo no pensamento. Mau crítico, forte agitador de idéias, historiador literário de vistas amplas, foi um motor eficiente de modernização, e a sua História da Literatura Brasileira (1888) é um marco importante, pois mostrou como a produção literária do país já formava um corpus, dotado de características distintivas. Devem-se a ele estudos de filosofia, sociologia, política e as primeiras coletâneas amplas da literatura oral, que analisou segundo o critério étnico, opinando que era a base indispensável para o estudo das formas eruditas.
Aponte quais são, segundo o texto, as principais características da escrita de Machado de Assis. 2- Resuma os principais pontos abordados no texto, em no máximo, 10 linhas.
Respostas
Machado de Assis era um homem exemplar.