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É inegável que a capoeira teve um papel preponderante na história cultural dos afro-descendentes no Brasil, além de representar uma atividade corporal que ia além do aspecto de uma técnica de luta, serviu, no período colonial, como uma forma estratégica de resistência física e cultural contra a escravidão.
Segundo Reis (1997), a capoeira, no Brasil, esteve vetada durante muito tempo pelo decreto número 487, de outubro de 1890. Nele, percebe-se a produção de algumas representações que geraram identidades no sujeito negro, a partir dos efeitos de verdade que elas produziram no pós-cativeiro, como: formadores de bando ou malta, vadios, malandros, desordeiros, preguiçosos, etc.. Todas essas representações passaram a conviver com os afro-descendentes, frente à sociedade brasileira, que queria um negro dócil e comportado e que aceitasse a condição de inferioridade. Já na América do Norte, os negros, no período escravagista, foram coibidos de manifestar sua cultura corporal na forma de dança, assim como na religião, sendo que, nessa última, deu-se o processo de aculturação. Esses aspectos levaram ao entoar de cânticos, como expressão de desgosto, frente à situação de penúria da condição escrava.
Nos estudos de Oliveira (2001), os negros spirituals, como foram chamados os cativos boreais, deram início à forma de lamento chamado blus, um tipo de canção que se popularizou por todo o mundo.
Traçando um paralelo dos negros brasileiros e estadunidenses, pode-se notar uma maior vinculação cultural dos brasileiros, principalmente para o futebol, a dança e, também, a música. Já entre os norte-americanos, para o basquete, o atletismo e, fundamentalmente, a música.
De certa forma, existe uma semelhança, quanto às manifestações corporais na prática dos esportes e em nível artístico, sendo necessário frisar que essas identidades foram reforçadas, frente às circunstâncias sociais desfavorecidas e às oportunidades a que os negros foram submetidos, ao longo da história.
Tal situação, de certa forma, colocou a população negra na dependência direta com seu corpo, ou seja, os negros necessitaram adquirir um corpo forte para o trabalho pesado, no qual se viram inseridos pelo processo de exclusão social.
Os locais destinados às pessoas negras, com o desenvolvimento sociocultural, fomentaram os discursos das identidades sociais, culturais e esportivas. E, como comenta Capoeira (1996, p. 42): “é exatamente por ter sido sempre tratado como corpo que encarna exclusivamente trabalho que este lado da cultura africana se viu reforçado para que se estruturasse estrategicamente, visando à preservação e ao fortalecimento do corpo como instrumento de transmissão de cultura”.
No Brasil, desde os tempos de Rui Barbosa, a cultura européia foi idealizada pelas elites vigentes, como modelo de uma sociedade burguesa que inspiraria o ideal de liberdade e um espírito revolucionário nos trabalhadores brasileiros e teve guarida no período do Estado Novo. A população negra, há pouco saída da condição de escrava, era produzida como desqualificada e analfabeta para os sonhos de crescimento da nova ordem, de cunho positivista; branquear a população transformou-se em um imperativo para o ideário da nação. Essas asserções estão fortemente veiculadas nos comentários de Soares (1994, p. 105), aos emigrantes, que diz:
“A imigração atendia a duas preocupações básicas desta nova classe do poder. De um lado dava conta do trabalho, propriamente dito, de modo mais ‘competente’ e até certo ponto criativo, e de outro contribuía para aumentar, no Brasil, a população branca, ainda pequena no final do império”.
A autora ainda continua seus comentários sobre os imigrantes e traça uma comparação entre a população brasileira, de maioria negra, na qual inculca passividade e uma servilidade imanada no seu ser, enquanto o imigrante, afirma Soares (1994, p. 104-105),
“[...] contribuiu de modo decisivo para viabilizar no Brasil a construção da nova ordem. Foi por assim dizer, o motor do estágio de desenvolvimento capitalista no Brasil naquela época. De um outro lado fez nascer, no pequeno operário brasileiro, as idéias de liberdade, as idéias revolucionárias, as idéias de luta”.
As dificuldades encontradas pelos afro-descendentes, até a metade do século passado, ganharam dimensões sociais, culturais e ideológicas que estabeleceram inúmeros discursos, dizendo da incapacidade dos sujeitos negros para o processo de produção, dentro de uma filosofia capitalista que emergia e as traduções em identidades, com as mais variadas atribuições de cunho negativo.
Nessa esteira, a Educação Física emergia no Brasil, no início do século XX, como meio de consubstanciar as medidas de melhoria da “raça” da população brasileira, que possuía um grande contingente de população negra e a ela atribuíam comportamentos de servidão e analfabetismo, que dificultariam a escalada do progresso emergente do país.