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Qual o principal reflexo da pandemia de gripe espanhola para a saúde pública brasileira?
Respostas
Resposta: A maior pandemia causada por vírus Influenza dos últimos tempos foi registrada há cem anos: a gripe espanhola, que assolou a Europa e chegou a atingir diversos países, incluindo o Brasil, dizimou entre 20 e 40 milhões de pessoas, segundo a estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS). Os impactos para o Estado do Rio de Janeiro e a resposta ao problema – que envolve o cientista Carlos Chagas – estão descritos no livro A virologia no Estado do Rio de Janeiro: uma visão global, de autoria dos pesquisadores Hermann Schatzmayr, do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), e Maulori Cabral, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A publicação, que teve sua segunda edição publicada em 2012, está disponível para download gratuito. Falecido em 2010, Hermann Schatzmayr foi um dos expoentes da virologia brasileira [saiba mais sobre o cientista].
A publicação relata que os primeiros casos da gripe com alta taxa de letalidade foram registrados em 1918, após a Primeira Guerra Mundial, entre militares e civis. A pandemia recebeu o nome de gripe espanhola devido ao grande número de casos relatados inicialmente no país, que estava neutro no conflito armado e permitiu a divulgação de dados epidemiológicos. No entanto, dezenas de outros países também foram atingidos.
Estimativas apontam que em oito meses de circulação da cepa virulenta, metade da população mundial tenha tido contato com o microrganismo. A doença, que se manifestava inicialmente como uma gripe comum, evoluía rapidamente para um quadro de pneumonia grave. Nos casos mais acentuados, poucas horas após a internação surgia o quadro de cianose (a tonalidade azulada da pele relacionada à baixa oxigenação) e, em curto prazo, evolução para óbito por insuficiência respiratória aguda.
A principal hipótese é de que o vírus tenha chegado ao Brasil pelo porto de Recife, em setembro de 1918, trazido por marinheiros brasileiros que prestavam serviço militar em Dakar, no Senegal. Em setembro, a doença foi detectada em 88 militares que retornaram do país africano e, em outubro, foram diagnosticados casos em Niterói. As primeiras mortes no Estado apareceram em 14 de outubro, quando o número de pacientes chegava já a 20 mil.
O livro relata que o pânico tomou conta da cidade do Rio de Janeiro, capital do país à época, à medida que os casos aumentavam em número e gravidade. Aos poucos, serviços públicos como escolas e repartições foram interrompidos e o atendimento na área da saúde se tornou caótico. A situação crítica levou à renúncia do então Diretor Geral de Saúde Pública (cargo aproximado ao de Ministro da Saúde atualmente), Carlos Seidl. O novo diretor, Theóphilo Torres, convidou o pesquisador Carlos Chagas, que havia assumido a direção do Instituto Oswaldo Cruz em 1917, para atuar no controle da epidemia. Chagas liderou a campanha de combate ao agravo, implementando cinco hospitais emergenciais e 27 postos de atendimento à população em diferentes pontos do Rio de Janeiro.
Famílias inteiras foram dizimadas, principalmente as que viviam em condições mais vulneráveis. Os corpos acabavam sendo deixados na rua, onde permaneciam alguns dias até serem recolhidos, ampliando o cenário de devastação. Houve falta de serviço de transporte, alta dos preços e escassez de alimentos. Por volta de 19 de outubro, a doença já havia atingido metade da população do Rio, estimada em 700 mil pessoas, deixando a cidade vazia e silenciosa. O livro relata que este cenário crítico perdurou até o final do mês, quando houve um declínio drástico no número de casos e a cidade começou a retornar às suas rotinas diárias. Estima-se a epidemia tenha causado a morte de cerca de 15 mil pessoas no Rio.